Arquivo de agosto, 2011

Drummond. Imenso !

Publicado: 31/08/2011 em Poesia

MÃOS DADAS

Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente.

 

Poemas Imensos. Parte II.

Publicado: 31/08/2011 em Poesia

 

 

Eu
quando olho nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora
quem está por fora
não segura
um olhar que demora
de dentro de meu centro
este poema me olha

Paulo Leminski

 

 

 

A Rua

 

Bem sei que, muitas vezes,
o único remédio
é adiar tudo. É adiar a sede, a fome, a viagem,
a dívida, o divertimento,
o pedido de emprego, ou a própria alegria.
A esperança é também uma forma
de contínuo adiamento.
Sei que é preciso prestigiar a esperança,
numa sala de espera.
Mas sei também que espera significa luta e não,
[apenas,
esperança sentada.
Não abdicação diante da vida.

A esperança
nunca é a forma burguesa, sentada e tranquila da
[espera.

Nunca é a figura de mulher
do quadro antigo.
Sentada, dando milho aos pombos.

Cassiano Ricardo

 

Antes de amar-te, amor, nada era meu
Vacilei pelas ruas e as coisas:
Nada contava nem tinha nome:
O mundo era do ar que esperava.
E conheci salões cinzentos,
Túneis habitados pela lua,
Hangares cruéis que se despediam,
Perguntas que insistiam na areia.
Tudo estava vazio, morto e mudo,
Caído, abandonado e decaído,
Tudo era inalienavelmente alheio,
Tudo era dos outros e de ninguém,
Até que tua beleza e tua pobreza
De dádivas encheram o outono.

Pablo Neruda

 

Gosto dos venenos mais lentos, das bebidas mais amargas, das drogas mais poderosas, das idéias mais insanas, dos pensamentos mais complexos, dos sentimentos mais fortes… tenho um apetite voraz e os delírios mais loucos.
Você pode até me empurrar de um penhasco que eu vou dizer:
– E daí? Eu adoro voar!
Não me dêem fórmulas certas, por que eu não espero acertar sempre. Não me mostrem o que esperam de mim, por que vou seguir meu coração. Não me façam ser quem não sou. Não me convidem a ser igual, por que sinceramente sou diferente. Não sei amar pela metade. Não sei viver de mentira. Não sei voar de pés no chão. Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma pra sempre

Clarice Lispector

 

Silêncio

Assim como do fundo da música
brota uma nota
que enquanto vibra cresce e se adelgaça
até que noutra música emudece,
brota do fundo do silêncio
outro silêncio, aguda torre, espada,
e sobe e cresce e nos suspende
e enquanto sobe caem
recordações, esperanças,
as pequenas mentiras e as grandes,
e queremos gritar e na garganta
o grito se desvanece:
desembocamos no silêncio
onde os silêncios emudecem.

Octavio Paz

 

 

Eita nóis. O que vale realmente a pena? Quanto beleza neste vídeo. Amor superando o desejo. Nem sei. Vejam só meus amigos. Vejam só:

A MORTE COMO CONSELHEIRA – Rubem Alves

 

Lembra-te,

antes que cheguem os maus dias,

e se rompa o fio de prata,

e se despedace o copo de ouro,

e se quebre o cântaro junto à fonte,

e se desfaça a roda junto ao poço…

 

Eclesiastes 12, 1-8

 

A vida está cheia de rituais para exorcizar a Morte. Agora, quando escrevo, dia 3 de janeiro de 1991, acabamos de passar por dois deles. É claro que não lhes damos este nome, pois o seu sucesso depende de que o Nome Terrível não seja ouvido. Para isto se faz uma barulheira enorme de sinos, fogos de artifício, danças, risos, muita comida, e alegria engarrafada… E tudo isso só para que a voz Dela não seja ouvida… Natal não é isto? Não existe uma tristeza solta no ar? O esforço desesperado de repetir um passado, fazer com que ele aconteça de novo? Encontrei, certa vez, numa loja nos Estados Unidos, um pacotinho de ervas e temperos num saquinho de plástico com o nome: “perfumes de Natal”. Tem de ser aqueles cheiros antigos, de infância. As músicas novas não servem, é preciso que as mesmas dos outros tempos sejam cantadas de novo. E que haja o mesmo rebuliço, os mesmos bolos, as mesmas frutas. Prepara-se a repetição do passado, para se ter a ilusão de que o tempo não passou. Melhor o incômodo da correria e da ressaca do que a dor de ouvir o que Ela está silenciosamente dizendo: “É, mas o tempo passou. Não pode ser recuperado. Você está passando…” Pensar dói muito. O Natal dói muito…. E saímos da depressão da perda por meio de um outro ritual. Tolice imaginar que o tempo passou. Que nada. É um novo tempo que vem. Há muito tempo à espera. “Feliz Ano Novo!” E, no entanto, é tudo mentira. Certo está o poeta:

 

Mas o que eu não fui, o que eu não fiz, o que nem sequer sonhei;

o que só agora vejo que deveria ter feito,

o que só agora claramente vejo que deveria ter sido

isto é que é morto para além de todos os Deuses…

Pode ser que para outro mundo eu possa levar o que sonhei.

Mas poderei eu levar para outro mundo o que me esqueci de sonhar?

Esses, sim, os sonhos por haver, é que são o cadáver.

Enterro-os no meu coração para sempre, para todo o tempo, para todos os universos… (Álvaro de Campos, Poesias, “Na noite terrível…”)

 

Não, não, a Morte não é algo que nos espera no fim. É companheira silenciosa que fala com voz branda, sem querer nos aterrorizar, dizendo sempre a verdade e nos convidando à sabedoria de viver.

O que ela diz? Coisas assim:

“Bonito o crepúsculo, não? Veja as cores, como são lindas e efêmeras… Não se repetirão jamais. E não há formas de segura-las. Inútil tirar uma foto. A foto será sempre a memória de algo que deixou de ser… E esta tristeza que a beleza dá? Talvez porque você seja como o crepúsculo…. É preciso viver o instante. Não é possível colocar a vida numa caderneta de poupança…”

“Você sabe que horas são? Está ficando frio… E as cores do outono? Parece que o inverno está chegando…”

“O que é que você está esperando? Como se a vida ainda não tivesse começado… Como se você estivesse à espera de algum evento que vai marcar o início real da sua vida: formar, casar, criar os filhos, separar da mulher ou do marido, descobrir o verdadeiro amor, ficar rico, aposentar… Como se os seus instantes presentes fossem provisórios, preparatórios. Mas eles são a única coisa que existe…”

“E esta música que você está dançando? É de sua autoria? Ou é um Outro que toca, e você dança? Quem é este Outro? Lembre-se do que disse o poeta ‘Sou o intervalo entre o meu desejo e aquilo que os desejos dos outros fizeram de mim’. Mas, se você é isto, o intervalo, você já morreu… Acorde! Ressuscite!”

A branda fala da morte não nos aterroriza por nos falar da Morte. Ela nos aterroriza por nos falar da Vida. Na verdade, a Morte nunca fala sobre si mesma. Ela sempre nos fala sobre aquilo que estamos fazendo com a própria Vida, as perdas, os sonhos que não sonhamos, os riscos que não tomamos (por medo), os suicídios lentos que perpetramos.

“Lembra-te, antes que se rompa o fio de prata e se despedace o corpo de outro”, e que seja tarde demais.

Uma das canções mais belas do Chico eu nunca ouvi tocada no rádio. Tenho perguntado, e pouca gente conhece. Desconfio. É porque ela é a mansa sabedoria da Morte, que ninguém quer ouvir. Diz assim: “O velho sem conselhos, de joelhos, de partida, carrega com certeza todo o peso de sua vida. Então eu lhe pergunto sobre o amor… A vida inteira, diz que se guardou do carnaval, da brincadeira que ele não brincou… E agora, velho, o que é que eu digo ao povo? O que é que tem de novo pra deixar? Nada. Só a caminhada, longa, pra nenhum lugar… O velho, de partida, deixa a vida sem saudades, sem dívida, sem saldo, sem rival ou amizade. Então eu lhe pergunto pelo amor… Ele me diz que sempre se escondeu, não se comprometeu, nem nunca se entregou… E agora, velho, que é que eu digo ao povo? O que é que tem de novo pra deixar? Nada. Eu vejo a triste estrada aonde um dia eu vou parar. O velho vai-se agora, vai-se embora sem bagagem. Não sabe pra que veio, foi passeio, foi passagem. Então eu lhe pergunto pelo amor… Ele me é franco. Mostra um verso manco dum caderno em branco que já se fechou. E agora, velho, o que é que eu digo ao povo? O que é que tem de novo pra deixar? Não. Foi tudo escrito em vão… E eu lhe peço perdão mas não vou lastimar”… Parece até que o Chico e o Jorge Luis Borges entraram de acordo, pois este escreveu coisa muito parecida: “Instantes: Se eu puder viver novamente a minha vida, na próxima trataria de cometer mais erros. Não tentaria ser perfeito. Relaxaria mais. Seria mais tolo ainda do que tenho sido. Na verdade, bem poucas coisas levaria a sério. Seria até menos higiênico. Correria mais riscos, viajaria mais, contemplaria mais entardeceres, subiria mais montanhas, nadaria mais rios. Iria para lugares onde nunca fui, tomaria mais sorvete e menos sopa. Teria mais problemas reais e menos problemas imaginários. Eu fui uma desta pessoas que viveu sensata e produtivamente cada minuto de sua vida. Eu era uma destas pessoas que nunca ia a parte alguma sem um termômetro, uma bolsa de água quente, um guarda-chuva e um pára-quedas. Se voltasse a viver, viajaria mais leve. Se eu pudesse voltar a viver, começaria a andar descalço no começo da primavera e continuaria assim até o fim do outono. Daria mais voltas na minha rua, contemplaria mais amanheceres e brincaria com mais crianças, se tivesse outra vez uma vida pela frente. Mas, já viram, tenho 85 anos e sei que estou morrendo…”

É! Embora a gente não saiba, a Morte fala com a voz do poeta. Porque é nele que as duas, a Vida e a Morte, encontram-se reconciliadas, conversam uma com a outra, e desta conversa surge a Beleza. Agora, o que a Beleza não suporta é o falatório, a correria… Ela nos convida a contemplar a nossa própria verdade. E o que ela nos diz é simplesmente isto: “Veja a vida. Não há tempo pra perder. É preciso viver agora! Não se pode deixar o amor para depois. CARPE DIEM!”

Foi esta a primeira lição do professor de literatura do filme A sociedade dos poetas mortos. CARPE DIEM: agarre o dia! E o efeito de tal revelação poética, nascida da reconciliação da Vida com a Morte, é uma incontrolável explosão de liberdade. É só isto que nos dá coragem para arrebentar a mortalha com que os desejos dos outros nos enrolam e mumificam.

Tive um amigo, Hans Hoekendijk, um holandês que esteve prisioneiro num campo de concentração alemão. Contou-me de sua experiência com a morte. A guerra já chegava ao fim, e os prisioneiros acompanhavam num rádio clandestino o avanço de tropas aliadas e já faziam o cálculo dos dias que os separavam da liberdade. Até que o comandante da prisão reuniu a todos no pátio e informou que, antes da libertação, todos seriam enforcados. “Foi um grito de lamentação e horror… seguido da mais extraordinária experiência de liberdade que jamais tive em minha vida”, ele disse. “Se eu morrer dentro de dois dias, então nada mais importa. Não há sentido em me guardar, não há sentido em ser prudente. Não preciso pretender ser outra coisa do que sou. Posso viver a minha verdade, pois nada pode me acontecer. Não preciso de máscaras. Tenho a permissão para a honestidade total. Posso ir ao guarda nazista, que sempre me aterrorizou, e dizer a ele tudo o que sinto e penso… Que é que ele pode me fazer? Posso ir até aquela mulher que sempre amei mas de quem nunca me aproximei (afinal, ela estava com o marido, e naqueles tempos isto era levado em consideração…) e pedir licença ao marido para confessar os sentimentos… Posso dizer tudo o que sinto mas que nunca me atrevi a dizer, por medo”. E me contou dessa experiência fantástica de liberdade e verdade que se tem quando se está pendurado sobre o abismo. A Morte tem o poder de colocar todas as coisas em seus devidos lugares. Longe do seu olhar , somos prisioneiros do olhar dos outros, e caímos na armadilha de seus desejos. Deixamos de ser o que somos para sermos o que eles desejam que sejamos. Diante da Morte, tudo se torna repentinamente puro. Não há lugar pra mentiras. E a gente se defronta então, com a Verdade, aquilo que realmente importa. Para ter acesso a nossa verdade, para ouvir de novo a voz do desejo mais profundo, é preciso tornar-se um discípulo da Morte. Pois ela nos dá lições de vida, se acolhemos como amiga. ” A morte é nossa eterna companheira” – dizia Don Juan, o bruxo. ” Ela se encontra sempre a nossa esquerda, ao alcance do braço. Ela nos olha sempre até o dia que nos toca. Como é possível alguém se sentir importante, sabendo que a Morte o comtempla? O que você deve fazer ao se sentir impaciente com alguma coisa, é voltar-se para sua esquerda e pedir que a sua Morte o aconselhe. Estamos cheios de lixo! É a Morte é a única conselheira que temos. Sempre que você sentir, como acontece sempre, que tudo está indo de mal a pior,e que você se encontra a ponto de aniquilado, volte-se para sua Morte e lhe pergunte se isso é verdade. Sua Morte lhe dirá que você está errado, que nada realmente importa, fora do seu toque. Ela lhe dirá “ainda não te toquei”. Alguém tem que mudar e depressa. Alguém tem que aprender que a Morte é caçadora e que ela se encontra a nossa esquerda. Alguém tem que pedir o conselho da Morte e abandonar a maldita mesquinharia que pertence aos homens que vivem as suas vidas como se a Morte nunca fosse bater no seu ombro.

Houve um tempo em que o nosso poder perante a morte era muito pequeno. E por isso os homens e mulheres dedicavam-se a ouvir a sua voz e podiam tornar-se sábios na arte de viver. Hoje, o nosso poder aumentou, a Morte foi definida como inimiga a ser derrotada, fomos possuídos pela fantasia onipotente de que nos livramos de seu toque. Com isso, nós nos tornamos surdos às lições que ela pode nos ensinar. E nos encontramos diante do perigo de que, quanto mais poderosos formos diante ela( inutilmente, porque só podemos adiar..)mais tolos nos tornamos na arte de viver. E, quando isso acontece, Morte que podia ser conselheira sábia, transforma-se em inimiga que nos devora por detrás. Acho que para recuperarmos um pouco a sabedoria de viver seria preciso que nos tornássemos discípulos e não inimigos da Morte. Mas para isso seria preciso abrir espaço em nossas vidas para ouvir a sua voz.Seria preciso que voltássemos a ouvir os poetas….

 

 

Referência

 

ALVES, Rubem. A morte como conselheira. In: CASSORLA, Roosevelt M. S. (Coord). Da morte. Campinas: Papirus, 1991.


 

Trabalho em um banco há quase 29 anos.

Nâo ganho muito.

Ganho bem suado o dinheiro que o patrão resolveu pagar pela tabela do  DEUS MERCADO.

Mas nestes quase 29 anos NUNCA, nem um mês sequer, o meu salário chegou atrasado.

Nem o salário de mais de 105.000 pessoas.

Aliás, paga-se adiantado. Todo dia 20 o salário do próprio mês nos é creditado.

Médicos, Advogados, Engenheiros, Professores, Garis, Domésticas, Psicólogos, Nutricionistas, Enfermeiros, Economistas, Arquitetos. Todos os profissionais merecem receber em dia.

Toda profissão é digna debaixo do sol e aos olhos do Criador.

De tão óbvio este texto que chego a sentir pena de mim mesmo.

Por absoluta falta de criatividade.

Mas é isso.

O salário atrasado de forma crônica, maldosa, maledicente, arquitetada, engenbrada, corrupta, gera o pior tipo de profissional que existe no mercado: o descompromissado.

Temos os heróis nos plantões dos hospitais da vida, nas salas de aula, nos ônibus, varrendo as ruas, todos trabalhando com a barriga gemendo.

Mas tem uma classe que muito próxima , diria até por experiência, irmã gêmea da profissão mais antiga do mundo, que não trabalha de forma alguma com os salários atrasados.

É o jogador de futebol.

Endeusado.

Artista.

O craque.

O gênio.

O grande sacana que não está nem aí para o uniforme que usa.

Graças a Deus hoje não consegui entrar no Eládio de Barros Carvalho.

Nâo havia ingressos populares, não estou com  a mensalidade de sócio em dia, perdi o TCN e para a arquibancada de R$ 30,00 a fila dobrava a Angustura.

Fui prá casa com o meu filho.

Que excelente negócio fizemos.

Me compadeço dos irmãos alvirrubros que sofreram os 90 minutos.

E ficaram diante da mais cruel realidade: o salário atrasado sempre perde de qualquer expulsão.

Vamos em frente.

Os ditadores estão caindo mundo afora.

Ou sendo expulsos.

Um dia (já escrevi isso aqui) a gente pula o alambrado.

Viva Rubem Alves  e o seu texto a Morte como Conselheira.

Ela está bem ao nosso lado, ao alcance da mão esquerda.

E devemos perguntar a ela: – esse empate de hoje com a Lusa tem algum valor?

Raphael Rabello. Torpedaço de Daniel. Que disse bota no Fusca. É da boa. Que bom ouvir isso. Em outras épocas quando alguém dizia isso era … marijuana. Eita nóis. E nossos filhos. Alegrias incomensuráveis. Amém e boa semana a todos.

Um Ipê Amarelo foi cortado e seu tronco

foi transformado em um poste.

Após o poste ser fincado na rua,

foram instalados os fios da rede elétrica.

Eis que a árvore se rebela contra a maldade

humana e resolve não morrer.


Mas a reação foi pacífica, bela e cheia de amor.

Rebrotou e encheu-se de flores.

Assim é a natureza…vencedora !

Porto Velho – RondôniaBrasil

 

 L I M I N H A

Durante muitos anos no Brasil, a produção musical era entregue à gente que, apesar de certa competência, militava nos estúdios , tinha intimidades com o “sucesso” , no dia-a-dia aprendia a manipular os equipamentos de gravação, no entanto poucos, muito poucos tinham alguma formação musical. Em geral, as gravações ficavam nas mãos de técnicos enquanto um único engenheiro pulava de uma sala prá outra, observando (supervisionando) enquanto os artistas registravam (ou tentavam) suas obras. Por outro lado, o arranjador limitava-se à sua função, permanecendo ao lado da mesa, em geral observando o “produtor” trabalhar e dando pitacos que não raro terminava em acaloradas discussões. O arranjador queria  o som do piano “assim” e da bateria “assado” e o esforçado produtor não conseguia sequer entender, quiçá indenficar e registrar os timbres desejados.

Por outro lado, desde os primórdios, os estúdios americanos e europeus funcionavam de forma bem diferente. O produtor tinha conhecimentos musicais e em geral participava também como arranjador ou no mínimo, conseguia compreender o que este pretendia. O engenheiro permanecia de plantão, sempre à postos e trabalhava com dois ou três técnicos de som.

Arnolpho Lima Filho, o nosso Liminha, antes de se assumir como produtor musical, percorreu um bom caminho. Músico (tecladista,guitarrista e especialista em contra-baixo), começou tocando em bandas de bailes, entre estas OS BAOBÁS. Nessa fase, passou a integrar a revolucionária banda OS MUTANTES em 1970 como contra-baixista quando Arnaldo Baptista resolveu assumir os teclados e pianos. Permaneceu no grupo até meados dos anos 70, deixando o conjunto pouco antes do fim definitivo. Já bastante respeitado como músico, Liminha era bastante requisitado para shows e gravações com artistas de estilos bem distintos (MPB,grupos instrumentais,rock,samba etc) , época em que veio à tona o seu fascínio pelos estúdios e iniciou seu período de aprendizado.

Liminha foi trabalhar como assistente na recém instalada e poderosa WARNER e ficou atônito quando se viu indicado como “produtor” de um grupo vocal feminino,inventado de última hora com o sucesso nascente da dance music ou “discoteca”. Chamava-se AS FRENÉTICAS. Liminha conta que, o que o assustou foi que as “meninas” jamais pisaram num estúdio e ele próprio nunca tinha produzido sozinho até então.A verdade é que inspirado numa música do Led Zeppelin, Nélson Motta inaugurara uma discoteca chamada THE FRENETIC DANCIN’ DAYS (Dancin’ Days viraria adiante, título de novela da Globo) e teve a idéia,agora bastante copiada, dos tais cantores garçons. No seu caso “CANTORAS”. Diante do repertório apresentado e sabendo que precisaria de uma canção “chiclete”, Liminha apelou à sua velha companheira, e RITA LEE lhe presenteou com PERIGOSA. Com essa canção “puxa-disco”, o álbum chegou direto às paradas e vendeu 700 mil cópias convertendo-se no primeiro disco platinado da Warner, apesar desta ter em seu cast várias estrelas incensadas da MPB.

Desde então, o conceito de “produtor musical’ mudou radicalmente. As gravadoras passaram à contratar pessoas com formação musical mais robusta e curiosamente, os discos brasileiros passaram a ombrear, em qualidade sonora, com qualquer um e de qualquer parte. Lincoln Olivetti, Robson Jorge, Miranda, Gildo Hora, Tom Capone e antos outros, passaram a ocupar os espaços antes exercidos por pessoas de menos competência.

Por sua experiência e conhecimento como músico, Liminha mantém algumas características peculiares que logo viraram modelo. Ele intervém nos trabalhos dos artistas de forma efetiva. Antes de tudo, procura se certificar do som, do estilo e da proposta do artista, preferindo escutá-los “ao vivo” (registrando a reação do público) e nos ensaios. Pede que estes levem material sobrando para as gravações e desta forma, consegue identificar as características particulares de cada um, podendo assim realçar os pontos fortes, os tipos de equalização e mixagem ideais, os timbres instrumentais e vocais e participar ativamente da escolha do repertório e da ordem das músicas no produto final. Nos anos 80, era possível idenficar uma produção feita por Lincoln Olivetti. Deslumbrado por seus teclados ultra-modernos, Olivetti os usava à exaustão. Diferente só a voz do intérprete. Já com Liminha, é necessário conferir no encarte porque, Gil soa como Gil, Titãs como Titãs, Beth Carvalho como Beth Carvalho… e todos na melhor forma.

Só para ilustrar, leiam estes nomes: Gil, Ritchie, Paralamas, Elis Regina, Barão Vermelho, Titãs, Kid Abelha, Raul Seixas, Belchior, Guilherme Arantes, Marina, Gabriel (O Pensador), Daniela Mercury, Ed Motta, JOÃO GILBERTO, Luís Melodia, Chico Science, Fernanda Abreu, Lulu Santos, Oswaldo Montenegro, As Frenéticas, Jorge Benjor, Forfun, O Rappa e Vanessa da Mata… entre outros, trabalharam e trabalham sob a batuta do vovô-garoto Liminha.

3 CURIOSIDADES: No primeiro disco de O RAPPA, Liminha sugeriu que gravassem uma versão da música de JIMI HENDRIX, HEY JOE com levada de reggae. Deu liga! ; durante as gravações de FULLGÁS com MARINA LIMA, Liminha criou uma LINHA DE BAIXO que até hoje é referência para os estudiosos do instrumento; Liminha é co-autor com GIL do super-sucesso VAMOS FUGIR.

Nos dias atuais Liminha se desvinculou das gravadoras e trabalha como “free lancer”. Geralmente em seu próprio estúdio,salvo engano,chama-se NAS NUVENS. Dizem que Gil é seu sócio.

Olhando para trás, podemos afirmar que dos ex-mutantes, não foi só a Rita Lee que desenvolveu uma brilhante carreira musical no Brasil.

 

 

Há épocas de calmaria em que a rotina e o tédio nos fazem companhia.

Buscamos quebrar esses momentos mudando os hábitos, novas opções de lazer.

Reinventando a vida.

Há momentos em que estamos em tanta turbulência que até temos saudade da velha rotina.

Há momentos em que a paz desaparece e quando lá na frente nos abraça outra vez, o alívio é um renascimento.

Mas há as visitas da Ceifadeira.

Do Mistério. Do indefinido. Da outra margem.

Aquela em que só saberemos na mais completa solidão e abandono. Quando o mundo escuro e frio nos vier acalentar.

Quando o berço cruel  corta os laços deste mundo conhecido e nos arruma para a viagem ao mundo do nada. Do vazio absoluto.

De onde com certeza já não saberemos se somos. Para onde temos a certeza que iremos.

E de sexta-feira prá cá foi uma porrada atrás da outra.

Um menino de 16 anos, já humildemente lembrado no outro post e agora um amigo de mais de 40 anos. Irmão do meu irmão mais velho. Colegas do ITA . Me conheceu quando eu tinha 08 anos de idade. Amizade fraterna com toda a família, com os meus irmãos, meu pai, minha mãe. Um sujeito de raro caráter, desses que você passa um tempão sem ver e quando encontra parece que foi ontem. A mesma alegria. A mesma luz. A mesma bondade. Impressionante. É assim.

Mas a Morte  só precisa de um mote. Uma lâmpada, uma escada, uma queda e uma morte cerebral.

E nosso amigo levita. Deixando o sorriso e a amabilidade como marca maior.

O vi ano passado. Morava em São Paulo. No mesmo casamento da minha sobrinha onde estava o jovem filho da minha amiga. Os dois, coincidentemente, eram pessoas de uma alegria marcante. Um com 59 anos outro com 16 anos. E Vitor Hugo disse tudo. E eu não digo mais nada:

A vida não passa de uma oportunidade de encontro; só depois da morte se dá a junção; os corpos apenas têm o abraço, as almas têm o enlace.

Victor Hugo

E depois chego de novo para junto com o Pink Floyd , celebrar a vida desses dois seres humanos que não importando o tempo que passaram por esta Terra, foram de uma humanidade demasiadamente humana:

 

E a tradução do Cifra Club pode até em incorrer em erros, mas só hoje me apercebi que a música é estonteante e eterna. Mas a letra é poesia e infinita:

Queria Que Você Estivesse Aqui

Então,Então você acha que consegue distinguir
O paraíso do inferno
Céus azuis da dor
Você consegue distinguir um campo verde de um frio trilho de aço?
Um sorriso de um véu? Você acha que consegue distinguir?

Fizeram você trocar Seus heróis por fantasmas?
Cinzas quentes por árvores?
Ar quente por uma brisa fria?
Conforto frio por mudança?
Você trocou Um papel de coadjuvante na guerra Por um papel principal numa cela?

Como eu queria, como eu queria que você estivesse aqui
Somos apenas duas almas perdidas
Nadando num aquário Ano após ano
Correndo sobre este mesmo velho chão
O que encontramos?
Os mesmos velhos medos
Queria que você estivesse aqui

Quando o filme acabou, na exibição de pré-estréia teve gente que riu, gente que saiu na metade. São duas horas e quarenta minutos. Uma tijolada. Uma fotografia belíssima, um roteiro disperso. E no final saí do filme com uma interrogação. Sou muito burro ou não estou preparado para o novo cinema americano. Será?

Van Gogh.

Publicado: 22/08/2011 em Poesia

 

O amor é eterno – a sua manifestação pode modificar-se, mas nunca a sua essência… através do amor vemos as coisas com mais tranquilidade, e somente com essa tranquilidade um trabalho pode ser bem sucedido.

Acredito cada vez mais que não se deve julgar o bom Deus por este mundo, pois foi um estudo dele que saiu errado.

Procura compreender o que dizem os artistas nas suas obras-primas, os mestres sérios. Aí está Deus.

Quando sinto uma terrível necessidade de religião, saio à noite para pintar as estrelas.

Prefiro morrer de paixão a morrer de tédio.

Van Gogh

Começando a semana com Carpinejar.

Publicado: 22/08/2011 em Poesia

Recebi ontem a notícia de que o filho de uma pessoa querida havia levitado. Aos 16 anos, acidente de moto.

Não há muito o que dizer. Provavelmente eu diante dessas situações fico em estado de coma. A mãe não sei como irá adiante. Mas as mães são um enigma de Deus.

Enviei para uma pessoa muito próxima a ela , o poema de Alice Ruiz. Alice que perdeu o seu filho Miguel Angelo . Filho que foi fruto do seu casamento com Paulo Leminski. Seu único filho varão.

Os poetas falam quando a gente cala:

Saudação da saudade (Alice Ruiz)

 

minha saudade
saúda tua ida
mesmo sabendo
que uma vinda
só é possível
noutra vida
 
aqui, no reino
do escuro
e do silêncio
minha saudade
absurda e muda
procura às cegas
te trazer à luz
 
ali, onde
nem mesmo você
sabe mais
talvez, enfim
nos espere
o esquecimento
 
aí, ainda assim
minha saudade
te saúda
e se despede
de mim

PS I  –

Poema Para Paulo Leminski

vai
meu amigo
desta vez
não vou contigo

a morte
é um vício
muito antigo
só que nunca
aconteceu
comigo

pode ir
que eu não ligo
eu fico por aqui
separando
tijolo do trigo

Solda

 

PS II –

Leite, leitura
letras, literatura,
tudo o que passa,
tudo o que dura
tudo o que duramente passa
tudo o que passageiramente dura
tudo,tudo,tudo
não passa de caricatura
de você, minha amargura
de ver que viver não tem cura

Paulo Leminski

S  T  I  N  G

Como falar de Sting e não citar The Police, uma das mais importantes,criativas e fundamentais bandas de rock da história ?  Mas, por isso mesmo, a banda merece e será objeto de um post futuro. Por enquanto, preferi me ater ao genial músico, cantor, compositor e ator (pois é) que confesso, me pegou de surpresa, me derrubou do cavalo, e tive de reordenar certos conceitos musicais na época em que iniciou sua carreira solo. Fui então, curioso, levado à tentar compreender as razões que o levaram à uma guinada radical e arriscada em sua carreira pós-Police, já que se esperava dele, principalmente, a continuidade do estilo da ex-banda.

De família modesta, seu pai era revendedor de leite e a mãe, cabelereira, GORDON MATTHEW THOMAS SUMNER, ganhou de um tio sua primeira guitarra aos 12 anos, na pequena Wallsend, interior da Inglaterra. Depois de um bom período estudando o instrumento, mais tarde adotaria o contra-baixo motivado por seus estudos de jazz. Apesar de fã do rock e de estilos mais atuais, STING era um autêntico fissurado em jazz, tanto que ainda em sua cidade atuaria em grupos desse seguimento como o Phoenix Jazz Men, o Last Exit e a New Castle Big Band. Livrava também uns trocados lecionando literatura inglesa em pequenas escolas da cidade (SIC).

Ainda no tempo do THE POLICE, teve sua primeira experiência como artista solo apresentando-se em um show da ANISTIA INTERNACIONAL, acompanhado pela modesta banda The Secret Police (Phil Collins, Eric Clapton, Jeff Beck, Bob Geldof e Midge Uri) cantando “Roxanne” e “Message In A Bottle”. Mas com o fim do THE POLICE, surpreenderia o mundo pop com um album radicalmente longe do som de sua ex-banda e quase totalmente centrado no jazz moderno. THE DREAM OF THE BLUE TURTLES reunia a fina flor do ramo.Músicos como Kenny Kirkland (teclados e piano), Darryl Jones (baixo), Omar Hakim (bateria) e Branford Marsalis (sax). Modestamente, Sting limitou-se à uma discreta guitarra e ao papel de compositor e cantor. O álbum apresentou de cara 4 sucessos imediatos: as canções IF YOU LOVE SOMEBODY SET THEM FREE; RUSSIANS; FORTRESS AROUND YOUR HEART e LOVE IS THE SEVENTH WAVE. A crítica e boa parte dos fãs não paravam de citar a deliciosa MOON OVER BOURBON STREET, com sua letra e andamento puros NEW ORLEANS à meia-noite. De cara o disco levou o Grammy de “melhor album europeu” e foi indicado na categoria de melhor disco de “jazz”.

Naturalmente entusiasmado, Sting reuniu o mesmo grupo e mais duas vocalistas para uma excursão pela Europa, Estados Unidos, Canadá e Japão, acrescentando ao repertório releituras jazzísticas de algumas pérolas do POLICE. Escolhidas criteriosamente, as canções ganharam novo frescor, cores diferentes e  contagiantes que, longe de comparações, mais ainda valorizaram a competência de seu antigo grupo.Estes shows, devidamente filmados e gravados, deram origem à um filme em VHS e ao album-duplo chamados BRING ON THE NIGHT. Obra Prima, mais que fundamental, uma homenagem ao bom gosto. E é importante ressaltar que numa época em que o gosto geral, até no Brasil, tendia quase 100% para a NEW WAVE e ao eletrizante BREAK de Michael Jackson,  foi preciso muita coragem e determinação do artista para enveredar por uma “praia” completamente fora do contexto na época, ainda mais tendo sido STING um dos baluartes da onda pós-punk. Pegue os melhores e mais bem sucedidos discos daquele período e os compare à BLUE TURLES e especialmente à BRING ON THE NIGHT. Desta vez, o GRAMMY de melhor album vocal de jazz veio sem sustos.

Nos intervalos entre seus trabalhos, colaborava em discos e shows de seus colegas. Co-escreveu e dividiu os vocais com Mark Knopfler no super hit do DIRE STRAITS, Money For Nothing. Gravou com Clapton, Phil Collins, Sheryl Crow, Joss Stone, Tom Jobim e se apresentou com McCartney. Antes, enquanto elaborava seu novo trabalho, foi assistir à orquestra do genial BILL EVANS que entre outras, executara duas canções de JIMI HENDRIX. Após conversarem sobre o saudoso guitarrista, Sting convidou BILL e a turma para participarem de sua regravação de LITTLE WING e o resultado foi de extasiar. Apesar de exausivamente regravada, a música ganhou sua melhor versão desde que Hendrix a escreveu e foi lançada no album duplo NOTHING LIKE THE SUN que seguia a mesma linha dos anteriores. O delicioso balanço rock-funk de We’ll Be Together, hit instantâneo, com seus contracantos empolgantes seria a única música do disco fora do padrão jazzy. Outro discaço.

Em sua passagem pelo Brasil, Sting conheceu e adotou a causa indígena, desfilando pelo mundo ao lado do cacique RAONI o que resultou em “quase nada” e ainda ganhou a pecha de “chato”. Seu disco THE SOUL CAGES só não passou despercebido graças ao sucesso da sacolejante ALL THIS TIME. Logo após essa fase franciscana, o músico lançou duas maravilhas simplesmente imperdíveis: TEN SUMMONER’S TALES (1993), eleito o ALBUM DO ANO, e em 1996 MERCURY FALLING, que trazia uma bossa jobiniana com letra em francês chamada LA BELLE DAME SANS REGRETS. Uma de suas melhores criações.

Desde os anos 2000, Sting continua na linha de frente da música internacional. De fato,vem lançando albuns irregulares que trazem momentos ora brilhantes ora enfadonhos. Mas pelo curriculum e pela quantidade de canções magníficas que acumulou desde Roxanne, como artista já é de fato um dos mais geniais de sua geração.

Eita! E não é que quase esqueço ? Em 2001, STING ganhou mais um Grammy por sua interpretação de She Walks This Earth,versão em inglês da canção SOBERANA ROSA,escrita por um tal de IVAN LINS.

 

 

 

Vladimir Vladímirovitch Maiakovski

Estivesse vivo Vladímir Vladímirovitch Maiakovski estaria completando em julho último 121 anos.

Ao povo russo, ao menos ao longo de duas décadas após 1930, Maiakovski permaneceu vivo, ainda que para muitos do governo revolucionário russo sua genial poesia parecesse obscura e inatingível às massas populares do seu país.

Maiakovski nasceu em Bagdadi, ou Baghdati, segundo o Google, na Geórgia, em 7 de Julho de 1893, 19 de Julho pelo calendário ocidental. Naquela época a Geórgia era russa, e Maiakovski, teve seu início de envolvimento com a poesia e com a revolução quando foi preso, em 29 de Março de 1908, quando lutava contra as garras opressoras do Imperialismo.A tipografia onde habitualmente passava horas da sua juventude e que pregava os ideais revolucionários foi fechada e o bardo que se locomovia próximo ao local foi revistado pela polícia czarista, sendo com ele encontrada caderneta com importantes nomes de ativistas contrários ao regime imperial vigente.

Ficou preso por dois anos, aos 16 anos foi “libertado”. Falando do seu tempo de prisão deixou escrito:

“Eu, no entanto,

aprendi a amar no cárcere

…………………………………….

me enamorei da janelinha da cela 103

da “oficina de pompas fúnebres”

……………………………………..

então

por um raiozinho de sol amarelo

dançando em minha parede

teria dado todo um mundo.”

Na prisão escreveu poemas e textos diversos, e organizou um conjunto de poemas que pretendia ver transformado em livro, mas os originais foram apreendidos quando ganhou a “liberdade”.

A palavra liberdade foi aspeada mais uma vez porque ele saiu da prisão para cumprir um período de degredo, que somente não se materializou por influência de amigos e companheiros apaziguados pelo sistema.

Matriculou-se na Escola de Belas-Artes, conviveu com o Príncipe Lvov, que tentou mudar sua vontade de “crítica e agitação”.

Conselho não seguido, evidentemente, dado seu espírito irrequieto e ideais fortemente arraigados, cujos reflexos explodiriam pouco depois em sua poesia de forte tensão hiperbólica, com metáforas únicas e versos inesquecíveis (Neste vida/ morrer não é difícil/ o difícil é a vida/e seu ofício.) ou o famosa boutade: é melhor morrer de vodka do que de tédio.

Ao seguir nos estudos, combateu a linguagem acadêmica de muitos professores, aos quais apontava como decadentes e simbolistas. Costumava dizer sobre os conservadores e seguidores dos clássicos na literatura da sua época: eles “continuam a atirar ananases ao céu”.

Chegou a afirmar:

“…Que posso opor às estéticas antiquadas que me rodeiam? Por acaso a revolução não exigirá de mim que passe por uma escola séria? Fui visitar um camarada, Medvédev, que era então para mim um camarada do Partido. “Quero fazer uma arte socialista”. Meu amigo se pôs a rir às gargalhadas: “Tens os olhos maiores que a barriga”. Interrompi o trabalho de militante e me pus a estudar.”

Procurou depois completar sua instrução, de forma independente, com outros mestres, tendo se tornado amigo íntimo de Gorki. Logo funda o grupo futurista e busca, através de publicações regulares colocar suas posições e a de companheiros sobre a arte, a literatura e as ideias partidárias, sempre atacando a literatura conservadora.

Vale dizer, entretanto, que nenhum antes dele, e mesmo depois, levou a poesia engajada às lutas operárias e à vontade de melhores dias dos cidadãos simples do povo e do campesinato. Esta sua ação aguda não tem paralelo na história cultural da humanidade.

A Edi­to­ra Re­cord lan­çou em 2009 (salvo engano), de­pois de lon­ga de­mo­ra,  Mai­akóvski — O Po­e­ta da Re­vo­lu­ção (559 pá­gi­nas), do rus­so Aleksandr Mikhai­lov, com pre­fá­cio de Ale­xei Bu­e­no e tra­du­ção esmerada de Zoia Prestes.

No pre­fá­cio, Bu­e­no no­ta “a ri­que­za me­ta­fó­ri­ca e rít­mi­ca da po­e­sia de Vla­dí­mir Mai­akóvski, sua mes­tria no uso de hi­pér­bo­les, seu hu­mor cáus­ti­co, seu vir­tu­o­sis­mo no jo­go de pa­la­vras”.

Àque­le lei­tor que não quer ape­nas sa­ber os fa­tos da vi­da do po­e­ta, re­co­men­do três li­vros: Po­e­mas, de Mai­akovski, com tra­du­ções de Bo­ris Schnai­der­man, Au­gus­to e Ha­rol­do de Cam­pos, Po­e­sia Rus­sa Mo­der­na, com tra­du­ções do mes­mo trio, e An­to­lo­gia Po­é­ti­ca, de Maiakovski, com tra­du­ção de E. Car­re­ra Guer­ra.

Maiakovski, além da poesia, dos textos para teatro e artigos voltados à propaganda do partido da revolução, realizou inúmeras palestras e conferências. Sarcástico, não poupava os alienados.

Tinha mania de colecionar bilhetes e perguntas escritas por pessoas das platéias que lotavam para assisti-lo, nas diversas cidades em que visitava. Mas muitas vezes respondia as perguntas após a conferência, onde os poemas declamados sempre ficavam para o final. Foi um grande declamador, com uma capacidade de improviso na resposta sem igual.

Certa feita, foi questionado por alguém na platéia que lhe disse:

“__ Maiakovski, suas piadas não atingem meu entendimento.

__ É que você é uma girafa! – exclamou o poeta. – Somente uma girafa pode molhar os pés na segunda-feira e só ficar resfriada no domingo.”

Na mesma sessão um jovem mais atrevido o desafiou:

“__ Maiakovski, você nos toma a todos como idiotas, não?

__ Bem, bem… – responde Maiakovski – Por que a todos? Por enquanto só vejo um diante de mim.”

Mai­akovski ma­tou-se aos 36 anos, em 1930, quan­do Stá­lin, O se­nhor do po­der, ha­via ex­pur­ga­do ad­ver­sá­rios de pe­so co­mo Li­ev Trotski e en­qua­dra­va aque­les que pen­sa­vam di­fe­ren­te­men­te da or­to­do­xia do par­ti­do.

Por que Mai­akóvski se ma­tou, com um ti­ro no pei­to, se ha­via con­de­na­do o su­i­cí­dio do poeta Sier­guéi Ies­siê­nin, em 1925?

Mikhai­lov es­cre­ve, com per­ti­nên­cia: “A pes­soa que dei­xa vo­lun­ta­ria­men­te a vi­da le­va con­si­go o mis­té­rio de sua de­ci­são. Ne­nhu­ma ex­pli­ca­ção (in­clu­si­ve as de Mai­akóvski) pe­ne­tra na es­sên­cia re­al da ati­tu­de to­ma­da. Elas so­men­te en­tre­a­brem a cor­ti­na so­bre o se­gre­do, mas o pró­prio se­gre­do per­ma­ne­ce es­con­di­do atrás do fi­nal tris­te da vi­da. (…) En­con­tra­mos os mo­ti­vos, mas o se­gre­do per­ma­ne­ce em se­gre­do”.

Há dois pon­tos cen­tra­is. Pri­mei­ro, a Re­vo­lu­ção que Mai­akóvski ha­via co­la­bo­ra­do pa­ra cri­ar e for­mu­lar saía dos ei­xos e tra­ba­lha­va pa­ra en­qua­drar, cer­car e subordinar a li­te­ra­tu­ra, su­ge­rin­do que só a li­te­ra­tu­ra pro­le­tá­ria era li­te­ra­tu­ra.

O po­e­ta ten­tou se en­qua­drar, cometeu algumas tentativas de po­e­mas en­ga­ja­dos-proletários, pro­du­ziu car­ta­zes re­vo­lu­ci­o­ná­rios, mas sua cri­a­ti­vi­da­de, ti­da co­mo ex­ces­si­va e con­ta­gi­an­te, cho­ca­va os co­mu­nis­tas re­tró­gra­dos e não era en­ten­di­da pe­las mas­sas.

Es­cri­to­res ge­ni­ais co­mo Mai­akóvski têm seu es­to­que de in­ge­nui­da­de po­lí­ti­ca e acre­di­tavam que po­deriam in­flu­en­ciar as re­vo­lu­ções e os po­lí­ti­cos… Só que revoluções com inclinações genocidas tendem a de­vo­rar seus pró­prios fi­lhos.

Stá­lin de­vas­tou milhares de es­cri­to­res, operários, protéticos, enfim, quem porventura fizesse oposição à sua obsessão pelo poeder, ma­tan­do-os, en­vi­an­do-os pa­ra mor­rer no Gu­lag ou exi­lan­do-os. Mai­akóvski ava­liou  er­ra­do que po­de­ria se adap­tar. Aca­bou re­jei­ta­do pe­la po­lí­ti­ca da li­te­ra­tu­ra pro­le­tá­ria, mais pro­le­tá­ria, em ter­mos de qua­li­da­de, do que li­te­ra­tu­ra.

Che­ga­ram a boi­co­tar a en­ce­na­ção de sua pe­ça te­a­tral Os Ba­nhos.

O bi­ó­gra­fo Mikhai­lov diz: “…as cir­cun­stân­cias de sua vi­da pes­so­al eram-lhe in­con­tor­ná­veis. Vi­via em pro­fun­do es­ta­do de de­pres­são e pas­sa­va por uma cri­se de cri­a­ção em fa­ce de con­fron­to com o po­der so­vi­é­ti­co, mes­mo sem ain­da ter a con­sci­ên­cia do que se­ria no fu­tu­ro, mas sen­tin­do uma enor­me pres­são que pri­va­va a li­te­ra­tu­ra do ar de li­ber­da­de”.

Ima­gi­ne, pa­ra um cri­a­dor do por­te de Mai­akóvski, ter de pro­du­zir uma po­e­sia de bai­xa qua­li­da­de, pa­ra ser com­pre­en­di­do pe­las mai­o­ri­as e acei­to pe­la bu­ro­cra­cia, que ele abo­mi­na­va. Es­sa bu­ro­cra­cia me­dí­o­cre não acei­ta­va a sua sá­ti­ra, seu espírito iconoclasta, mo­der­no e sem fronteiras.   

Pro­va­vel­men­te, ao sen­tir que a Re­vo­lu­ção não era o pa­ra­í­so li­ber­tá­rio que ima­gi­na­ra e in­fe­liz no amor, roí­do pe­la de­pres­são, Mai­akovski op­tou por ma­tar-se. Ti­nha cer­ta con­sci­ên­cia de que o fu­tu­ro o aguar­da­va… pa­ra en­ten­dê-lo.

Mas eis que de­pois de sua mor­te, quan­do não mais in­co­mo­da­va, Stá­lin – em mais um dos seus crimes – o trans­for­mou no po­e­ta da re­vo­lu­ção e, nu­ma car­ta a Ie­jov, es­cre­veu:

“Pe­ço que dê aten­ção à car­ta de Lí­lia Brik. Mai­akóvski foi e con­ti­nua sen­do o me­lhor e mais ta­len­to­so po­e­ta da épo­ca so­vi­é­ti­ca. A in­di­fe­ren­ça com a sua obra é um crime.”           

Trágico cinismo, na mais caridosa das hipóteses: Stálin, um autêntico genocida, “indignado” com um crime.

Mas com busto ou sem busto, entre lunáticos e homicidas, Maiakovski sobreviveu e redimiu uma boa parte dessa gente com a força dos seus poemas, e a força de um lirismo poucas vezes lido.

Um exemplo, ou uma lição? Eis o que o Poeta decretou para o deleite da eternidade.

“DEDUÇÃO

Não acabarão com o amor,
nem as rusgas,
nem a distância.
Está provado,
pensado,
verificado.
Aqui levanto solene
minha estrofe de mil dedos e faço o juramento:
Amo firme,
fiel e verdadeiramente.”

Eis um breve retrato do mítico poeta Vladimir Vladímirovitch Maiakovski.

 

ARSENIO MEIRA JÚNIOR

O Fusca está engatinhando. Mas já tem uma bela história. E me vejo na mais completa e total e bela estiagem (obrigado Magna). Não consigo sair do canto e do canto me vejo sem nenhuma palavra que me faça apoio. Não há então o que fazer. O Sábado Som nos salva nos redime e nos abençôa. Junto com os comentários de todos os brodas e sistas.

Então, meu exercício tem sido garimpar no Fusca. De Agosto de 2009 até hoje. E começo com um repeteco. Talvez seja chatice. Mas achei legal o texto. Vou me atrever a colocar de novo.

INSISTÊNCIAS E DESISTÊNCIAS.

As insistências da vida o que na verdade são? 

E as desistências?

O que nos move a terminar um projeto, a lutar por um casamento, a permanecer no emprego?

Trabalho, coração e estômago? Será prá isso que viemos à luz?

Perguntas insistentes. Insistir é preciso.

Desistir é o dar de braços quando mais podemos nos fazer presentes. Não vale a pena.

Até o cansaço enjoa das nossas estórias. Até o cansaço cansa das repetições.

Insistir e desistir. A sineóide que é o gráfico da maioria dos viventes neste mundão/mundinho.

As desistências então… que me interrogam desde a segunda linha. Respondida em parte.

Respondida sem arte. Até ofendida ficou. Porque desistir passou a ser feio. Representa uma economia indevida daquilo que temos de mais precioso: a vida. A vida que não se economiza, que não se guarda, que não se junta como caderneta de poupança.

Poupar a vida significa desistência. Gastar a vida intensamente com qualidade e sabedoria é o resultado da insistência.

Por isso insisto nas coisas que amo. Acho que é o sinal de inteligência herdado do meu pai. Consolidado no cadinho a ferro e fogo do coração materno.

Insisto porque penso, logo não desisto.

A filosofia dançada ao reverso, que Schopenhauer morreu de tédio, e Maiakovsky de vodka.

E eu prefiro as luzes vermelhas. Mesmo que agora , aposentado, em sonhos.

E eu prefiro os amigos, de quem nunca me aposentarei. E insistirei sempre em tê-los por perto.

Já sabê-los onde estão isto me basta.

Quero insistir até na hora da morte. Como Goethe, nos derradeiros suspiros pedia LUZ! MAIS LUZ!!!

Que eu nunca me apequene diante das pessoas que amo. Que eu sempre insista nisso.

E aí vai a grande pergunta sem resposta que faço ao meu coração:

Insisto não para competir. Insisto não para investir. Insisto não para desistir.

Insisto porque para viver é preciso a chama. O fogo que vem d’alma. A luz que os corações enxergam como o cego no quadro de Rembrandt.

 

OS DOIS PS DA ÉPOCA NÃO COLOQUEI. OS COMENTÁRIOS PRESERVEI. ENFIM. É ISSO.

TEMPO DE ESTIO DE CAETANO VELOSO.

 

Quinta-feira cheia de bossa.

Publicado: 18/08/2011 em Poesia

Que o blogueiro anda mais sem inspiração que sei lá. Nem sei o nome disso:

Vê aí Magna. Prá relembrar o maravilhoso show de Gil com o filho. Um acústico que deixou nós pobres mortais com olhos marejados. E creio que Geraldo e Vinicius devem ter feito bonito.

Assim penso eu, posto que você e João já disseram que foi e foi mesmo.

Noutra vez vamos ver se a gente junta a turma para ir na Casa de Seu Jorge, onde se deu este vídeo. Casinha boa lá no Rosarinho. Bar melhor ainda. Petiscos no toitiço. Agora vamos saborear:

 

Tá chovendo por estas bandas meu velho.

Espero que onde andes faça sol. Sempre.

De mãos dadas com Celeste, com anjos ao redor. Assim te desejo. Descanso.

Sei da tua luta nesta vida. Imensa.

E sei também do teu exemplo. Grato por este legado.

Através da tua lente pude observar melhor meus amigos. E quantos amigos !!!

Eita Pai essa saudade não acaba nunca.

Cada dia sem você é um dia de menos quando a gente se encontrar.

Espero poder chegar até a tua altura. Na condição de ser humano que se encontra.

Que consegue iluminar a escuridão interior e viver em paz.

É o meu desejo. Chega de tanta briga. Por nada. Prá nada.

É como literalmente morrer na praia depois de tanto esforço.

Pai, teu clube era o rival Sport. E resolvi torcer pelo Náutico.

Tú nunca nem por um fio de cabelo, fizestes qualquer menção de um não. Fostes SIM. SEMPRE.

O NÃO surgia quando havia o desvio, as biritas, as noites mundo afora. Aí vinha a tua mão forte.

Segura e serena. A me mostrar o caminho. O teu caminho.

Que consegui alcançar. Quase me perdendo nos labirintos da cidade. Mas consegui.

Obrigado mesmo. Meus filhos agradecem. Ana manda um beijo. Ela que pode te conhecer.

Os meninos que te conhecem de fotografias e do filme do casamento.

Mas que te amam com tanta intensidade que te tenho como presença certa na mesa neste dia.

O teu lugar está reservado.

Eternamente.

No meu coração. Em nossos corações.

Beijão.

 

Teu filho.

  P E P P E R L A N D

Apesar de passados mais de 40 anos, foi não foi, publicam-se livros e críticas sobre o mais polêmico disco dos anos 60. Uns, cheios de paixões exageradas e irreais. Outros, destilando críticas e cobranças ainda mais sem sentido. Estes, geralmente, falam de falsa unidade,que não há um tema central ou que o album não é conceitual e, há até quem o critique, por ele ser tão bom que desvirtuou o rock,influenciando outros artistas negativamente. Mas a verdade é bem outra. Essa gente, às vezes até tenta disfarçar, fazendo crer que estão “contextualizando” o SGT. PEPPER’S LONELY HEARTS CLUB BAND dos BEATLES, mas não estão.

Em 1966, mesmo após o lançamento do disco REVOLVER, a Beatlemania mantinha-se no auge. Apesar de terem virado “marijuaneiros” via Dylan desde 64 e já estarem empreenden do viagens pelo planeta LSD, a banda continuava se exibindo pelo mundo com seus pobres amplificadores VOX de 100 watts competindo com a gritaria histérica da platéia, que variava entre 30 e 60 mil adolescentes por show. Com a tecnologia atual, tudo ficou fácil e simples mas em 66, mesmo em pequenos teatros, era impossível produzir música ao vivo com a qualidade que discos como o citado Revolver e o Rubber Soul exigiam. Não havia como. Assim, em apresentações que não passavam dos 30 minutos, o conjunto era obrigado a repetir seus primeiros sucessos noite após noite. Imagino que,para quem vinha criando obras como Tomorrow Never Knows,For No One, I Want To Tell You, Norwegian Wood e In My Life, repetir She Loves You,Love Me Do, Can’t Buy Me Love e que tais deveria ser um tremendo saco… naquelas circunstâncias.Para piorar, eram constantemente ameaçados pela violência dos fãs, da KKK, dos radicais direitistas japoneses e, no caso das Filipinas, chegaram à levar uns pontapés. Nesse ponto, o grupo definitivamente resolveu encerrar as turnês. Decisão unanime.

O grupo todo estava deslumbrado com a música de Pet Sounds dos Beach Boys (e do cérebro de Brian Wilson). Este album abalou positivamente a criatividade deles que, eram tão auto-confiantes e auto-suficientes que mais competiam musicalmente entre si do que com qualquer outro artista mas, mesmo assim, formavam uma entidade hermeticamente fechada, alicerçada por uma amizade sólida construida na quase-infância, ralaram e chegaram até ali juntos,unidos,e fóra os quatro, apenas Neil Aspinall e Mal Evans (amigos desde Liverpool) e um pouco Brian Epstein e George Martin participavam da intimidade da banda. Para ilustrar, cito um membro do THE BYRDS que perguntou a Harrison sobre “espiritualidade” e ouviu deste que “NÓS ainda não sabemos nada sobre isso! Quando Paul McCartney caiu de uma bicicleta , quebrou um dente e feriu o lábio superior esquerdo, para disfarçar o inchaço, deixou crescer o bigode e foi assim que se apresentou para as primeiras sessões do Pepper. Os outros acharam aquilo o máximo e dias depois, lá estavam todos de bigodes (inclusive Neil e Mal).

Com o fim das turnês, resolveram dar-se um tempo com retorno marcado para novembro de 66. Lennon foi filmar na Almeria levando na mala, além daquelas pílulas, as brochuras A Experiência Psicodélica (Leary) e O Livro Tibetano dos Mortos e voltou com Strawberry Fields Forever quase pronta.George Harrison foi passar 2 meses em uma casa/barco no Ganjes, estudando música e filosofia hindu com Ravi Shankar e voltou com sítar, tabla, swordmandell, sarod e outros instrumentos musicais indianos.Ringo ficou em casa engordando (SIC) e Paul ? Ah, Macca escreveu a trilha do filme The Family Way e zarpou pros EUA para encontrar a namorada e sondar as turmas dos Beach Boys, Byrds e Jefferson Airplane. Na viagem de volta, veio-lhe a idéia para o novo album e curiosamente, Mal Evans, que o acompanhava, perguntou o que significava as letras S e P naqueles saquinhos do jantar e Paul respondeu: “salt and pepper” (sal e pimenta) e BLÉM! Tocou o sino. Dali para Sgt. Pepper foi um pulo.

Bom, já temos as orígens do Sargento Pimenta e dos “bigodes”.Os revisionistas consideram isto ? No reencontro, Paul colocou aquela “idéia” que teve no avião: Este não será um disco dos Beatles mas,daquela BANDA DO CLUBE DOS CORAÇÕES SOLITÁRIOS DO SARGENTO PIMENTA. Que tipo de música eles fazem ? Todos.Sem amarras,vamos compor qualquer tipo de canção,de letras,de arranjos etc. O album será como uma apresentação desta banda com suas músicas e temas diferentes. Portanto, poderemos fazer o que quisermos. Observem que o “conceito” é exatamente nenhum conceito. Em nenhum momento, note-se, alguém falou ou sugeriu um TEMA PREPONDERANTE à ser seguido. Bom, mas de onde saiu essa história de “album conceitual” ? Ora, desse mesmo “povo” que agora reclama.Vejamos: Quando Lennon chegou com a idéia de STRAWBERRY FIELDS, ainda durante as gravações, McCartney apresentou Penny Lane (lembram da competição de que falei lá em cima ?). Estas duas jóias raras deveriam entrar no disco mas a EMI queria lançar um compacto urgente e, à contragosto, cederam as músicas, únicas prontas até então.E com o lançamento do single,a gravadora publicou cartazes com parte do mapa de Liverpool, indicando os 2 locais da cidade: o orfanato STRAWBERRY FIELDS e o girador central do bairro de PENNY LANE. Qualquer um que conheça estas letras,sabe que apesar de parecerem evocativas, elas tendem bem mais para o surrealismo psicodélico da época.Mas imediatamente,os agora revisionistas,alardearam que o novo disco trar ia como tema central a região nordeste e a infância dos Beatles.Seria evocativo. Volto à questionar: durante todo o processo de produção até o lançamento, alguém dos Beatles ou próximo deles, falou algo parecido ? Falou em um “tema central” ?

Na verdade, como sempre o fizeram, eles queriam apenas compor mais um disco diferente.Sem repetir fórmulas. Até então, jamais tiveram a oportunidade de fazer um album com paciência e dedicação exclusivas. Queriam explorar as possibilidades de um estúdio e não foi fácil. Não existiam as maquininhas mágicas de hoje, nem sintetizadores, nem um número de canais de gravação ilimitados. Eles só tinham 4 canais e as sonoridades e timbres nunca antes ouvidos foram  produzidos na base da imaginação e muito suor. Os engenheiros e técnicos liderados por George Martin fizeram milagres. Inventaram um aparelho para dobrar a voz, ligaram microfones em caixas Leslie, quase colocaram Lennon “pendurado de cabeça para baixo, girando” para cantar e George Martin na impossibilidade de usar um órgão Caliope, gravou os sons deste numa fita, picotou-a em pequenos pedaços, misturou tudo e tornou à colar os pedaços de forma aleatória e criou o efeito desejado para a canção For The Benefit Of Mr. Kite.Usaram grupos de metais, músicos indianos e uma orquestra com 45 músicos. As canções brotaram com naturalidade e o produto final foi, como combinado, realmente um catálogo de estilos, letras e sons de tirar o fôlego. Tinha o raga espiritual de Within You Without You, o vaudeville de When I’m 64, o circo do Mr. Kite, as “viagens” de Alice em Lucy In The Sky With Diamonds, a exuberância sonora de A Day In The Life e o comovente lamento de “pais aflitos” na irônica e bela She’s Leaving Home entre outras inventivas criações. Até que Neil Aspinall deu a idéia de a banda repetir a música título no final. E foi feito mas, eles modificaram o andamento e a letra que agora, anunciava o final do show. Tudo amarradinho como se fosse um concerto de verdade do grupo do Sargento.

Se os críticos de então e os revisionistas de agora “insistem” no tal disco conceitual que eles próprios inventaram, vale lembrar que após concluirem o repertório do album, os Beatles deixaram para o produtor George Martin a tarefa de distribuir e ordenar as canções do Pepper. E este o fez conforme seu ponto-de-vista, e fez bem. Mas se fosse um trabalho conceitual a banda tomaria essa atitude ? Na verdade,naquele momento eles já estavam gravando e filmando uma espécie de extensão do Pepper chamada Magical Mystery Tour. E no ano seguinte já estavam de volta de Pepperland e prontos para uma nova aventura longe,bem distante da Terra da Pimenta.E deu um BRANCO. O ALBUM BRANC O.